sábado, 6 de junho de 2015

O DIREITO CANÔNICO E A FORMAÇÃO DO DIREITO OCIDENTAL MODERNO

In LOPES, José Reinaldo de Lima. O Direito na História.  3ª ed – 3ª reimpr – S. Paulo: Atlas, 2011 – Cap. 04

1. Considerações a respeito do texto

O autor aborda o tema em nove pontos, demonstrando a importância do direito canônico na história do direito influenciando a organização das instituições, no processo e no conceito de jurisdição e da cultura jurídica, influenciando a reorganização completa da vida jurídica européia. Dos canonistas, sai a primeira classe de juristas profissionais com uma carreira assegurada na burocracia eclesiástica.
Se a tudo isto somarmos a influencia que a vida da igreja tem no Ocidente medieval, seja nas cortes seja no cotidiano das aldeias e paróquias, vemos que o direito canônico, como disciplina da vida, dissemina-se capilarmente na sociedade. O Direito Canônico pode ser definido como um direito disciplinar de um grupo religioso.
O Direito Canônico criou a distinção entre o foro interno (individual) e o foro externo (internação social). Diferentemente do primeiro, o segundo poderia ser delegado a um juiz e a um tribunal. O Direito Canônico, juntamente com o Direito Inglês, foi a primeira tentativa de racionalização jurídica da cultura ocidental.
Boa parte do direito brasileiro descende do direito canônico, sobrevivendo o procedimento inquisitorial até os dias de hoje.  
Por volta do ano 1000 surgiu no interior da Igreja um movimento de reforma que propunha uma série de reformulações: das relações entre o Poder Religioso e o Poder Político, das relações internas da própria Igreja etc. Nessa época era consagrado o Sistema Carolíngeo, que estabelecia a subordinação entre o poder eclesiástico ao poder político, reduzindo a autonomia da Igreja. O movimento, nascido na Abadia de Cluny, propunha o Sistema Monástico, que entre outras coisas proibia o casamento dos religiosos.
Esse movimento também estabeleceu a Trégua de Deus, que excomungava todos aquele que guerreassem em determinados dias e em determinados períodos do ano. Isso, na prática, começou a romper a estrutura do poder dos senhores feudais.
Nesse período também começou o processo de ruptura da noção dos costumes como fonte do Direito. Cabia ao legislador corrigir os costumes injustos ou inadequados através do direito posto. Esse processo somente será completado por volta do século XVIII.
             
2. Principais Idéias do Autor

Tratar-se-á de forma direta da divisão dos pontos elaborados pelo autor que considero mais importantes. Far-se-á uma explicação sucinta, direta com percepção de argumento crítico.

2.1 A reforma gregoriana e a querela das investiduras

O direito canônico será marcado pela transformação radical liderada por Gregório VII (papa entre 1073 a 1085). Mas o que foi a reforma gregoriana? A Igreja do Ocidente era uma comunidade sacramental, espiritual, não jurídica e nem uma monarquia centralizada em Roma, mas uma espécie de federação de igrejas nacionais. A autoridade papal era mais tradicional e moral que jurídica e não era eficaz politicamente. A mudança começa no campo do direito. As leis serão destacadas dos sacramentos. As leis não passavam de disciplinas e regras comuns vagas e abstratas.
            Com o intuito de libertar a Igreja do Poder secular, é que Gregório II contrapõe ao poder civil. Suas medidas tornam-se exemplares do que virá a ser o Estado: conforme a tipologia weberiana, dominação burocrática, racional, legal e formal. Aliado ao direito Romano Clássico e ao direito Inglês (camon Law), tendo em comum a organização jurisdicional com propósitos políticos determinados.  O Dictatus Papae emitidos por Gregório II e tornado público em 1705, com 27 preposições, destacando-se um poder centralizado no bispo de Roma, seu legado precede aos demais ainda que tivesse um grau hierárquico inferior aos demais, com poderes de depor e instalar bispos (não mais o imperador, como forma de compadrio), só ele podendo depor imperadores e de não ter nenhum de seus julgamentos revistos, mas ele podendo rever o de todos. Propõe também o celibato para por fim na hereditariedade dos cargos eclesiásticos dado aos leigos como “benefícios”, evitando que os filhos herdassem os cargos.  Também pôs fim a sacralidade dos reis, o rei estava dentro da igreja e não acima dela (imperator in Ecclesiam, non super Ecclesian; Esta centralização papal vai gerar conflitos com os reis da Inglaterra e Portugal, por isso a reforma gregoriana foi considerada por Berman a primeira revolução Ocidental, pois trouxe mudanças rápidas, de maneira consciente e violenta.  A Igreja pretende ser um poder paralelo ao Estado.
A carta de Henrique IV começará a Guerra das Investiduras, que durou 44 anos. Iniciou em 1708 e terminou em 1122 com a Concordata de Worms. O que foi a guerra das investiduras? Foi o enfrentamento do problema jurídico: “O imperador era considerado apenas um entre vários reis, mas o papa também era considerado um dentre vários bispos. Era a disputa entre o poder espiritual e o temporal. O resultado da Guerra das Investiduras foi com a Concordata de Worms foi: “O Papa investiria os bispos, mas o imperador teria direito de estar presente nas suas eleições”.
“Da concepção de Gregório VII começou nascer o estado: uma burocracia, um poder de criar legislação, uma ambição de universalidade” Diz LOPES (2011, p. 74). Com Gregório foi estabelecida uma um poder disciplinar, um controle central de uma população dispersa e uma identidade corporativa do clero com um certo corpo de leis disciplinares, o que deu uma consciência de classe, bem como a superioridade das leis sobre os costumes e regularizou a competições entre as entidades políticas, não mais pela força (potentia), mas pelo poder legítimo (potestas).
A disputa pelo poder entre o bispo da Igreja e o rei ou imperador, em limitar onde começa o poder do rei e onde termina o da igreja, ou quem manda em quem? Se os reis eram coroados pelo papa, logo o rei era inferior ao papa? O conflito de jurisdição entre a igreja e o rei, visto que foi a partir daqui que surgiu a figura do Estado.

2.2 A formação do Corpus Iuris Canonici

A reforma gregoriana trouxe a centralização da interpretação das leis. Só o Papa podia realizar a interpretação autêntica. Foi daqui que surgiu o princípio monárquico.
            Os canonistas auxiliaram o desenvolvimento desta idéia, pois jurisdição no período medieval era mais do que a função do judiciário de hoje. Ela tinha duas características: 1) “A justiça não era apenas uma das atividades do poder. Ela era a primeira, senão a única atividade do poder”.
A justiça era limitada pela doutrina do direito natural e a tradição e pelos direitos dos particulares e pela autonomia das corporações e costumes. A atividade legislativa, judiciária e administrativa não se separavam e qualquer decisão tornava-se vinculante.
2) A hermenêutica tinha primazia sobre a vida do direito. O fato da religião cristã ser uma religião normativa, através das Escrituras, como também o judaísmo e os mulçumanos serem a religião dos livros, a interpretação exigia normas próprias para vencer o obstáculo temporal entre o autor do livro e o intérprete, o que fez do direito uma disciplina intelectual. Em 1140 surgiu a obra fundamental do direito canônico clássico, o Decreto de Graciano. Uja coletânia de mais de 3.800 textos com comentários, serviram de fonte para os canonistas posteriores. Graciano era diferente dos juristas civilistas que viam o texto jurista como acabado, ele via como corpo vivo. Empregava método escolástico, que “em caso de contradição seria preciso fazer uma distinção”. Organizou hierarquicamente os princípios pelos quais se eliminava as antinomias dos cânones, usando quatro critérios: ratione significationis (eliminava as contradições pela investigação filológica), rationitemporis, rationi loci rationi dispensationis. Sendo o primeiro (distinguiam normas pelo seu tempo de vigência; a lei local particular revogaria a geral; a posterior revogaria a anterior; e pela matéria, a lei especial revogaria a  lei geral). Utilizando-se da racionalização da dialética, era preciso aplicar esta interpretação não de forma abstrata, mas caso a caso. (SUS Decretos tinhas três partes: Princípios e definições do direito canônico e suas fontes, hipóteses aplicativas as casos, variando a matéria penal, matrimonial etc.) e questões (problemas).
A Igreja passou a ter uma hegemonia de canonistas que constituíram a primeira burocracia moderna do Ocidente. O Papa Alexandre III (papa de 1159 a 1181) aluno de Graciano, produziu 700 Decretais, que eram vereditos ou decisões de casos concretos ou de consultas que se tornavam normas gerais.
            Surgiu também o Tribunal da Inquisição, tribunal extraordinário, de poder centralizado para julgar matéria de heresias. Também chamado de Tribunal de Exceção, porque escapava da jurisdição ordinária (dos bispos locais) e porque dispunha de regras processuais próprias.
            O conjunto de Decretos de Graciano e as Decretais de Gregório IX passou a ser chamada de Corpus Iuris Canonici. As universidades estudavam dois corpos de leis: direito canônico (eclesiásticos) e direito civil (romano, imperial, Cesário...) e o título conferido a quem estudasse leis e cânones era: Doctor Utriusque Iuris que significa: “doutor em ambos os direitos”.
O título de doutor para os bacharéis em direito vem desta época.
            A intelectualidade dos canonistas, fez deles a primeira  classe burocrática moderna que se distinguiu pelo notável saber das leis canônicas e civis.

2.3 O processo inquisitorial

Lopes afirma que segundo Foucault , o processo inquisitorial não tem origem exclusivamente canônica, mas numa nova forma de exercer o poder. Não mais pela guerra particular, mas fazendo perguntas. O inquérito como modelo judicial e jurídico tem uma origem dupla, religiosa e administrativa (estatal). O sistema inquisitorial já era procedimento conhecido pelos normandos, quando Guilherme I mandou fazer na Inglaterra  um grande inquérito administrativo, onde continha os registros de todas as tendências de terra do reino. Em Portugal D. Afonso III FEA as Inquisições também para levantar a situação das terras do reino. Mais tarde o mesmo ocorreu na França.
“O que significa tais inquéritos? Para Fucault era o surgimento de um novo personagem – um investigador e acusador a serviço oficial, representando o estado, que procede de forma ordenada e irracional, produzindo o resultado da investigação de modo diferente das provas irraconais anteriores”. (LOPES, p. 91)
Entretanto, as duas características da inquisição medieval, era a ter se tornado um Tribunal de Exceção (conduzia pelo legado papal e não mais n na jurisdição ordinária do bispo local) mas apenas nas matérias  consideradas sujeitas à inquisição, especificamente a heresia. A inquisição serviu de instrumento de centralização do poder monárquico da Igreja, no século XVI, nos Estados nacionais e na Península Ibérica.
Era um processo que se abria de ofício, a mando do inquisidor, parecido com nosso processo administrativo, e perdia o caráter de contraditório. Neste modelo, o juiz inquisidor tem a iniciativa oficial. Pelo fato de haver uma generalizada delação secretas este sistema se degenerou. Foi declarada guerra contra os hereges. A heresia no período medieval não era apenas uma questão espiritual, mas político, uma subversão contra as autoridades religiosas, os reis e príncipes que eram senhores cristãos.
Nasceu num contexto de revoltas, em meio a crise do clero e dos pobres dos séculos XII e XIII o que possibilitou a imposição do poder central do papado.
Em 1231 Gregório XI determinou na bula Excommunicanibus o procedimento dos inquisidores oficiais e profissionais que eram nomeados pelo papa. Deveriam ter depoimentos uniformes de duas testemunhas, que eram resguardadas o anonimato, que sob juramento poderiam ser contraditadas diretamente. As tarefas inquisitoriais foram confiadas aos mendicantes dominicanos, cujo propósito da ordem era combater o erro pela verdade e pobreza pela vida. Aos culpados eram impostas as penas de penitência na prisão, num convento, numa sede episcopal, com parede larga, ou estreita e acorrentados.
 Em 1252 Inocêncio IV permitiu a tortura para obter confissão. Os erros e excessos das punições cruéis foram conhecidos, pelo que Alexandre IV por uma bula estabeleceu que os inquisidores que se excedessem seriam submetidos à jurisdição extraordinária.
Na Europa dos séculos XVI e XVII a inquisição foi usada contra a Reforma Protestante, onde a intolerância religiosa fez a fogueira da “santa” inquisição arder, contra católicos, calvinistas, puritanos, luteranos e contra qualquer movimento de revolta social e político.
Mas foi também no processo inquisitorial que surgiu a figura do advogado de defesa obrigatória. Caso o réu negasse as acusações, o juiz inquisidor era obrigado a nomear um advogado, “mesmo que não fosse pedido”. Este jurava usar todos os remédios e defesas possíveis e se o réu fosse pobre os honorários seriam pagos pelos fundos públicos. Nos casos de heresias o advogado deveria demonstrar que não haviam ocorrido as duas condições do crime: “erro intelectual” e a “pertinência da vontade”. Assim a sua deficiência intelectual e seu estado emocional eram as “teses” fundamentais da defesa.
O processo inquisitorial medieval serviu de modelo para o direito brasileiro, que ainda se utiliza de alguns procedimentos processuais. Na esfera penal o Inquérito Policial, a necessidade do advogado, que se o réu for pobre, o poder público é quem paga, no Brasil o defensor público. As teses de defesa da insanidade mental ou da motivação para cometimento do delito, se fútil, torpe ou estado de necessidade, legítima defesa etc.

2.4 Contribuição da canonística para a teoria da pessoa jurídica
           
Foi a partir do direito canônico que surgiu a teoria da pessoa jurídica. Os problemas de patrimônio comum, representação, responsabilidade dos membros, responsabilidades dos dirigentes, sucessão, autonomia, autorização. A Igreja se viu diferente do império, onde nos laços de relações entre clérigos e leigos era diferente da relação entre senhores feudais e vassalos.
            Daí os princípios que surgiram foram: autonomia da associação, a corporação detinha direito sobre seus membros; em alguns casos os representantes devera ouvis os representados, sob pena de invalidade de seus atos; solidariedade entre os membros da corporação, aquilo que pertencia à sociedade pertencia aos seus membros, daí se originava o poder de taxar; quanto aos crimes e penas impostas, alguns casos era imputados a todos os membros e em outros apenas ao representante.
Assim se percebe que o direito é fruto das necessidades que surgem no decorrer da história das sociedades e que a criação das normas vem como soluções dos problemas que para regular os conflitos.

3. CONCLUSÃO

Pode-se entender que Gregório estabeleceu novos ditames do direto naquela época. Essa ação do Direito Canônico vem até os dias de hoje através da presença do Advogado de Defesa e o Inquérito Policial por exemplo.

Dessa feita, há em que se afirmar, sem precipitações, que o Direito Canônico é um dos marcos mais importantes e relevantes que o Direito teve. Pois foi através deste que uma nova concepção de separação da Igreja e o Estado principalmente acarretaram novas idéias e novos horizontes que se repercutiram ate os nossos dias. 

Dr. Abner Jara
OAB/AP 2919

sexta-feira, 5 de junho de 2015

DIFERENÇAS DO DIREITO SUCESSÓRIO NO CASAMENTO E NA UNIÃO ESTÁVEL

Nota-se que o texto constitucional de 1988 (art. 226, § 3º /CF), reconheceu a igualdade entre a união estável e o casamento, trazendo assim, em parte os mesmos direitos para ambos. Ou seja, muito embora a Constituição Federal tenha trazido tais igualdades de tratamento afetivo ao considerar ambos os institutos como entidade familiar, esta não atribuiu igualdades quando inseridos na esfera do direito sucessório brasileiro.
Portanto, este artigo trará as questões do direito sucessório no casamento e na união estável, abordando as diferenças estabelecidas pelo atual ordenamento jurídico brasileiro.

Sucessão no Casamento X União Estável


Para melhor compreensão é fundamental distinguir a diferença de herança e meação. Neste assunto, traz Fiuza:
Em linhas gerais, pode dizer-se que, em praticamente todos os quatro regimes de bens – comunhão universal, comunhão parcial, separação de bens e participação final nos aquestos –, o casal possui patrimônio comum, seja ele constituído de bens adquiridos pelo esforço comum ou não. Esse patrimônio comum pertence a casal, sendo metade do marido e metade da mulher. Morrendo um dos dois, a metade do viúvo distingue-se da herança, não sendo transmitida aos herdeiros. É a chamada meação do cônjuge supérstite. A outra metade, que pertencia ao inventariado, esta sim compõe a herança, sendo transferida aos herdeiros, que pode ser o próprio cônjuge sobrevivo, na falta de descendentes ou ascendentes, ou em concorrência com eles (FIUZA, 2006, p. 1016).
A meação não faz parte do objeto de herança a ser partilhado pelos descendentes em concorrência com o cônjuge. Logo, pode ser visto de maneira clara que o objeto da herança será apenas os bens que pertenciam a meação do de cujus.
Neste sentido Dias ressalta:
A legitimidade sucessória do cônjuge nada tem a ver com a meação: a metade dos bens comuns que não integram a herança pertence ao cônjuge sobrevivente. A existência do direito à meação e sua extensão depende do regime de bens do casamento. Somente no regime de separação bens o cônjuge não recebe meação, pois não existem bens comuns. Nos demais regimes faz jus à metade dos bens a título de meação. No regime da comunhão universal de bens, a meação corresponde a todos os bens que compõem o acervo hereditário. Em se tratando de comunhão parcial de bens, a meação incide o patrimônio amealhado durante o período da vida em comum. No regime de participação final nos aquestos, a meação e calculada sobre os bens adquiridos a título oneroso na constância do casamento. Não integram a meação os bens próprios, isto é, os adquiridos por cada um exclusivamente em seu nome, mas é feita a compensação de valores no fim do casamento. No regime de separação obrigatória de bens, aonde a autora Maria Berenice Dias chega a exaltar-se a chamando de inconstitucional, a lei nega o direito a meação. Porém, súmula do STF 377 alterou o regime alterou o regime para o da comunhão parcial, preservando o direito à metade do acervo comum (DIAS, 2008, p, 131)
Seguindo ao mérito deste artigo, assim dizem Carvalho e Carvalho ao tratar do Direito Sucessório no Código Civil de 1916:
No sistema do Código Civil de 1916, inexistindo herdeiros necessários, que eram apenas os descendentes e ascendentes, a herança era deferida ao cônjuge sobrevivente, qualquer que fosse o regime de bens, desde que não estivesse dissolvida a sociedade conjugal na época da morte. A separação judicial linha de estar transitada em julgado, pois, pendente de homologação ou de trânsito em julgado do decreto judicial, a dissolução da sociedade conjugal é superada e absorvida pela morte, cujos efeitos, por mais amplos, prevalecem, dentre eles, o direito à herança (CARVALHO E CARVALHO, 2009, p. 51 e 52).
Por sua vez, o Código Civil de 2002 trouxe mudanças:
O Código Civil de 2002 introduziu diversas inovações quanto ao cônjuge no direito sucessório, estando atualmente na situação jurídica de herdeiro necessário, herdeiro concorrente com descendentes e ascendentes, herdeiro único, conferindo-lhe ainda direito real de habitação, independentemente do regime de bens e de ser preferencialmente o inventariante (CARVALHO E CARVALHO, 2009, p, 53 e 54).
O Código Civil de 2002 manteve a ordem de vocação hereditária, porém, inovou substancialmente ao instituir o cônjuge como “herdeiro concorrente”. Com efeito, se o autor da herança deixar descendentes ou ascendentes, o cônjuge sobrevivente concorrerá na sucessão com os demais herdeiros necessários, entretanto, dependendo da situação, os quinhões são diversos (CARVALHO E CARVALHO, 2009, p, 55).
Como herdeiro necessário, o cônjuge, na ausência de descendentes e ascendentes, receberá por inteiro a herança, independente do regime de bens, desde que este não esteja separado judicialmente, posto que dissolvida a sociedade conjugal, perde-se os direitos sucessórios inerentes daquele que morreu (NERY JR. E NERY, 2005, p, 843).
Seguindo o texto do artigo 1829 do Código Civil, veja como se da sucessão no casamento:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais.
Ao ler o dispositivo legal acima, é evidente notar-se que nos incisos I e II o cônjuge é parte legítima para concorrência com os descendentes e ascendeste na sucessão, salvo as exceções descritas no inciso I.
Assim, além da meação, a título de concorrência sucessória, o cônjuge recebe também parte da herança junto com os herdeiros. Na concorrência com os descendentes, o direito está condicionado ao regime de bens. Já na concorrência com os ascendentes desimporta o regime de bens, pois este terá sempre direito a fração da herança. (DIAS, 2008, p. 132).
Quando verificado o dispositivo legal da sucessão na União Estável nota-se as diferenças:
Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.
Para melhor compreensão desta análise quantitativa de herança no casamento e união estável, tomar-se-á como base os ensinamentos de Dias:
Na concorrência sucessória com os descendentes, a fração a ser recebida por cônjuges e companheiros só é igual em uma única hipótese: quando todos os herdeiros são filhos seus, e isso se o número deles não for superior a três. Tanto o cônjuge como o companheiro herdam como se filhos fossem. A herança é dividida por cabeça entre o sobrevivente e os herdeiros. Assim, sendo um filho, a herança é dividida com o seu genitor. Sendo dois os filhos, eles ficam com dois terços da herança, e o cônjuge e o companheiro com um terço. O mesmo ocorre se forem três os filhos: cada um recebe uma quarta parte (DIAS, 2008, p. 149).

O tratamento igualitário termina aí, pois quando este número de herdeiros é superior a quatro, o cônjuge tem direito a uma quota mínima de ¼ da herança, recebendo quinhão maior que seus filhos. Assim, se o casal tinha 5 filhos, o cônjuge recebe 25%, e cada um dos filhos 15% da herança. Esta mesma garantia não é assegurada na união estável. Se os pais herdeiros dos herdeiros não eram casados (união estável), a divisão é igualitária entre o companheiro e os filhos: cada um recebe 1/6, 16,6% (DIAS, 2008, p. 150).
Análises comparativas da Sucessão no Casamento x União Estável

É exatamente sob o aspecto legislativo que se encontram as críticas doutrinárias em relação ao Código Civil de 2002 e o entendimento Constitucional sobre entidade familiar. Na visão de Carvalho e Carvalho se tem:
O Código Civil de 2002 reconheceu direitos sucessórios ao companheiro, entretanto, não o incluiu no Título II – Da Sucessão Legítima, especialmente no artigo 1.829, ao apresentar a ordem de vocação hereditária, preferindo referir ao companheiro em dispositivo isolado, no art. 1790, ao tratar das disposições gerais, o que além de discriminar, não é de boa técnica (CARVALHO E CARVALHO, 2009, p. 66).
Dias têm o mesmo entendimento e expõe que parte-se da hipótese de que no atual código civil o cônjuge foi promovido à condição de herdeiro necessário (CC 1.845), mas o companheiro não. O cônjuge ocupa o terceiro lugar na ordem de vocação hereditária. O seu direito é garantido, ou seja, à metade do acervo que integra a herança. Assim, quando do falecimento de um dos cônjuges, na ausência de descendentes ou ascendentes, a herança obrigatoriamente é transmitida ao sobrevivente. “O companheiro da união estável não goza do mesmo privilégio. É simplesmente herdeiro legítimo e não herdeiro necessário (CC 1.790) e como herdeiro facultativo pode imotivadamente ser excluído da sucessão (CC 1.850)”. (DIAS, 2008, p.69, grifo nosso).
Venosa por sua vez, argumenta da seguinte forma:
[...] Atualmente, por força da segunda lei, o companheiro sobrevivente, independentemente do prazo de duração da união estável ou de existência de prole, é meeiro em relação aos bens adquiridos onerosamente na respectiva convivência. [...] Poderia o legislador ter optado em fazer a união estável equivalente ao casamento em matéria sucessória, mas não o fez. Preferiu estabelecer um sistema isolado, no qual o companheiro supérstite nem é equiparado ao cônjuge nem se estabelecem regras claras para sua sucessão (VENOSA, 2005, p.150, grifo nosso).
Dias ao citar Guilherme Calmon Nogueira da Gama trás um entendimento diverso, onde este afirma que, o companheiro não é herdeiro necessário sob o fundamento de que a inclusão do cônjuge na condição de herdeiro necessário representa o prestígio legal a autênticas e efetivas uniões fundadas no casamento, servindo como estímulo às pessoas para que convertam suas uniões informais em uniões formais (DIAS apud GAMA, 2008, p. 69).
A renomada doutrinadora Maria Helena Diniz, por sua vez, destaca essa questão:
A união estável, por sua vez, gera consequências sucessórias. [...] Pelo Projeto de Lei n. 276/2007, acrescentar-se-á § 3º ao art. 1.723, no seguinte teor: “A produção de efeitos na união estável, inclusive quanto a direitos sucessórios, havendo litígio entre os interessados, dependerá da demonstração de sua existência em ação própria”. Trata-se, porém de simples técnica de proteção (DINIZ, 2010, p. 145, grifo nosso).
Dando mais fundamentação ao que relata, Diniz critica afirmando:
Há desigualdades de tratamento sucessório entre o cônjuge e convivente sobrevivo, pois aquele é, em certos casos, herdeiro necessário privilegiado, podendo concorrer com descendentes, se preencher certas condições, ou com ascendente do falecido. O convivente, não sendo herdeiro necessário, pode ser excluído da herança do outro, se ele dispuser isso em testamento [...], pois só tem direito à sua meação quanto aos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável (DINIZ, 2010, p.154).
Dessa feita, nota-se que realmente o debate tem sido polêmico entre os doutrinadores. 


OBS: Se você quiser esse artigo na íntegra, com a parte histórica, definições de casamento e natureza jurídica, quadro comparativo com as diferenças entre união estável e casamento, posso enviar por e-mail a vocês, basta solicitar. Vai ajudar bastante nas provas e concursos. Indico a leitura do Projeto de Lei 4.944/2005 (Do Sr. Antonio Carlos Biscaia).


Amplexos!
Dr. Abner Jara
OAB/AP 2919





domingo, 24 de maio de 2015

Seja Bem Vindo!

Olá meus caros leitores!

Esse Blog tem por objetivo informar e atualizar você, Acadêmico de Direito, sobre os temas mais relevantes na atualidade, na seara jurídica. 

Bons Estudos! Lembre-se: "conhecimento não se cria, mas se constrói"

Amplexos.

Dr. Abner Jara
OAB/AP 2919